Revisado em 12 de abril de 2017
Quero compartilhar um pouco da história do Dr. John Bonica (1917-1994), considerado o pai do Tratamento intervencionista da dor. Dr. Bonica dedicou cinco décadas de sua vida lutando e trabalhando incansavelmente para estabelecer a dor como área de estudo e para disseminar o trabalho do Médico Intervencionista da Dor.
Inspirado pela própria história de vida e pelo sonho de levar formas de amenizar a dor a todos, teve sucesso em comprovar a importância da dor e do controle dela, originando um movimento científico internacional e multidisciplinar para o estudo da dor. Ele propôs a integração criativa de neurocientistas básicos e clínicos gerais para desenvolver a área.
Mesmo após sua morte, Dr. Bonica continua uma fonte de inspiração para médicos intervencionistas da dor em todo o mundo, além de servir como exemplo de superação da dor crônica. (Uma carreira no ringue lhe marcou com sequelas músculo-esqueléticas que causaram dor crônica e complexa pelo resto de sua vida.)
Nascido em 1917, em uma pequena ilha perto da Sicília, sua família emigra para Nova Iorque onde o pai falece em 1932. Arrimo da família, ele vende jornais, frutas e verduras para sustentá-la; lutador amador no colégio, se profissionaliza para custear os estudos de medicina. Casou-se com Emma Baldetti em 1942.
Em consequência da esposa quase morrer com anestesia primitiva com éter durante o primeiro parto, ele desenvolve a primeira anestesia epidural contínua para aliviar a dor do parto. Ao dar à luz ao segundo filho, ela se torna a primeira mulher do Noroeste Pacífico a ter um parto com anestesia epidural.
Ele conta que, enquanto chefe de anestesiologia do Madigan Army Hospital durante a II Guerra Mundial, apareciam “casos que me intrigavam”. Encaminhava seus pacientes para os colegas ortopedistas, neurocirurgiões, e psiquiatras, mas “eles sabiam menos que eu”. Propôs então reuniões semanais para discutirem os casos mais difíceis e foi assim que começou o tratamento da dor por equipe multidisciplinar.
Nas cirurgias passou a usar o bloqueio regional (o qual ele aprendeu sozinho pesquisando na literatura) aliado com técnicas pioneiras de alívio da dor, conseguindo amenizar o sofrimento de mais de 10,000 soldados feridos na guerra sob seus cuidados. Durante toda sua vida esta experiência serviu como incentivo para aliviar a dor dos outros.
Convencido da eficácia desta nova abordagem no controle da dor, em 1947, convidado para ser Chefe do Depto. de Anestesiologia do Tacoma General Hospital, fundou uma Clínica Multidisciplinar de Dor. Em 1953, publicou sua maior obra, o tratado O Manejo da Dor, (2a. publicação, 1990). Dr. Bonica publicou dezenas de livros e artigos científicos.
Em 1960, estabeleceu e dirigiu o Depto. de Anestesiologia da Universidade de Washington, fundando circa 1969 um Centro de Dor Multidisciplinar, que, com o tempo, passou a oferecer cuidados ambulatoriais. Foram reabilitados dois-terços dos pacientes que já haviam se submetido, sem sucesso, a tratamentos convencionais para alívio da dor crônica . Neste centro também desenvolveram técnicas de anestesia regional para cirurgia e obstetrícia. . . . “A base do meu programa é o cuidado ao paciente; a pesquisa é somente a cereja do bolo”.
A presença de estresse e depressão entre os pacientes levou à integração de psicólogos e psiquiatras à equipe. Um deles, Wilbert Fordyce, percebeu a importância dos fatores ambientais na dor de alguns pacientes; identificou a importância do fator comportamental no paciente de dor crônica, e do desenvolvimento de estratégias diagnósticas e terapêuticas no tratamento da Dor Crônica.
Em 1973, Bonica reuniu 300 pesquisadores em Seattle e juntos endossaram a criação da IASP
(Associação Internacional para o Estudo da Dor). Hoje a entidade tem mais de 5600 membros representando 83 países e 45 regionais em todo o mundo.
Dois anos depois, fundou a revista Pain (Revista da Dor, Ed. Wolters Kluwer), uma referência na pesquisa científica de melhoria dos tratamentos da dor aguda e crônica e na colaboração interdisciplinar.
Tivesse John Bonica vivido até hoje, teria visto o Tratamento Intervencionista da Dor se firmar no Brasil e a área ser reconhecida pela Associação Médica Brasileira, inclusive com alguns dos maiores hospitais do país tendo este Serviço.
Sua preocupação, visão e compromisso incessante de dar o alerta sobre a importância da dor, o estudo da dor e seu tratamento multidisciplinar, catalisaram os avanços atuais nas pesquisas da dor, e levou a uma maior conscientização sobre este elemento fundamental do sofrimento humano.
(Citações da Oral History of John Bonica, 1993)
Quer saber mais? Veja este TED-talk sobre a contribuição do Dr. John Bonica para alívio da dor como conhecemos
Para profissionais médicos:
Guia para o Tratamento da Dor em Contexto de Poucos Recursos
